O Mito da Fluência

O objetivo de todo estudante de línguas mal guiado é ser "fluente". 

A "fluência" seria um estado de benção, tal qual o nirvana, onde o pobre estudante pode finalmente falar, ler, escrever e ouvir a língua sem o sofrimento da ignorância ou do estranhamento. Falar e ser não apenas perfeitamente compreendido mas tampouco levantar estranhamentos até do nativo mais exigente.

Pois bem, infelizmente a "fluência" não existe. Para usar porcamente um conceito matemático, o estudo de uma língua é como uma curva que tende à fluência, mas sem jamais tocá-la.

Poderíamos dizer que é possível que essa curva chegue tão perto da fluência que na prática a tocou, mas na grande maioria dos casos não é essa a realidade dos estudantes.

Conheço vários imigrantes, que estudaram e vivem em um país de língua estrangeira por décadas, são cultos e esforçados, e teoricamente deveriam possuir essa tal de fluência. Apesar disso, esses ditos 'fluentes' frequentemente confundem as palavras, a perdem ou a usam de maneira errada, mesmo em assuntos mundanos.

Quando o assunto não é mundano, correm para um dicionário ou para amigos e parceiros nativos, na busca de palavras.

Os adoradores da 'fluência' pregam que esse estado legendário existe de fato. Como religião não se discute mas se procura entender, vejo apenas três situações onde poderiamos talvez presenciar esse estado sobrenatural:

Efeito Cioran. Cioran foi um filósofo romeno que odiava a Romênia com uma paixão tão forte que dedicou toda sua vida a se desromenizar. Aprendeu francês e dominou a língua com tal maestria que se tornou um escritor francês renomado. 

Efeito bilinguismo do berço. Pessoas que são regularmente expostas a falantes nativos de mais de uma língua desde o nascimento criam uma habilidade  de conseguir compartimentalizar o cérebro nas diversas línguas que eles falam. Estudos científicos mostram que essas pessoas podem ligeiramente alterar até mesmo suas personalidades dependendo de qual língua estão falando.

Efeito talento mais obessessão. Existem sempre os talentosos obsecados que conseguem destruir barreiras e se tornarem sobrehumanos. Como Bolt, Ayrton Senna, Mozart ou Machado de Assis.

Ou seja: um vida dedicada a odia sua pátria natal, uma criação ideal ou um talento notável são as únicas possibilidades de se alcançar essa fluência.

Visto isso, o melhor é simplesmente esquecer desse estado épico e se focar no mundano: pronúncia facilmente compreensível, dominio da gramática básica e vocabulário de um menino de 12 anos que gosta de assitir documentários. O resto é ilusão.

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